a distância não existe quando te insinuas assim ao meu olhar


hoje voltei a sonhar contigo e tu não sabes

a distância não existe quando te insinuas assim ao meu olhar

podia dizer-te que voltámos a fazer amor e que até a esta hora em que te escrevo e tu me olhas, sei que olhas, continuamos a fazer amor

mas prefiro falar-te de como tudo começou de como tudo começou com aquela frase gravada no teu olhar    aritmética simples do coração arritmia     o teu não sei talvez não porque talvez nada do que queres te possa dar e o meu não estou assustado por ter de te esperar 

que o tempo não existe e se existe é apenas para que eu te possa esperar

e não tenho medo
e não tenho medo de andar pelas ruas desta  cidade que é só varandas e janelas e muitos olhos e varandas e janelas e muitos olhos a apontar: aquele é dos que espera, o pobre não se importa de esperar

a canção dos futuros segredos toca baixinho até a conseguirmos ouvir, eles não sabem
a canção dos futuros segredos toca baixinho até a conseguirmos ouvir

e eu já comecei a ouvir a canção que toca baixinho e nunca precisei de te levar àquela sala de tonéis e uma certa luz de anoitecer brilhante, sempre estiveste lá e ao leres isto sei que vais fechar os olhos e vamos estar lá e tu vais olhar-me e quando tu me olhas sinto-te a entrar  dentro de mim pé ante pé e a luz vai aprender a calar-se e a minha mão há-de agarrar-se à transpiração da tua tatuagem e a distância deixará de existir comigo a cheirar-te, que sempre gostei de te cheirar, a adivinhar o teu cheiro, a cheirar-te para além do teu cheiro, a cheirar-te por dentro

e daqui a 10 anos vamos continuar naquela sala de tonéis e uma certa luz e o teu cheiro e daqui a 10 vou estar talvez demasiado velho e sabe-se lá com que mãos, de parkinson ou alzheimer, mas  vou continuar a estar lá contigo e a sonhar contigo e acordar contigo a dizer: sempre quis estar com um homem que para além de estar comigo alimentasse noites de sonho comigo porque não há nada mais bonito do que sonhar-se com quem já nos pertence completamente

que eu sei que pertences
e ainda não te disse mas ficas bem de azul, parece-me sempre que vestiste o céu ou o mar, e ainda não te disse mas ficas bem de verde e de preto e de sandálias e com um livro amarelecido sobre os joelhos com a flor que deve ter sido escrita para ti e o livro também para ti e o rio ao fundo e a flor foi escrita para ti e brota do teu cabelo amarela e gosto do teu queixo pequena ameixa radiante de verão e das tuas tranças e gosto do teu queixo e das tuas tranças e as tuas tranças devem ter música que só posso sonhar contigo que és a árvore que me oferece o vento e me ensina a língua azul dos pássaros e o rio ao fundo à espreita

e os sábados nos teus lábios serão sempre muito melhores do que os sábados podem ser

e mesmo nos dias em que as manhãs tragam o nevoeiro, que os haverá, e mesmo nos dias em que as manhãs tragam o nevoeiro  e façam amanhecer desertos para molhar o nosso sono ou inventem outras mil maneiras de chorar não haverá no mundo sangue suficiente para me separar de ti que vim para te completar, embora não te falte parte alguma, vim para te completar

e o meu único talento é ver-te existir, decorar os teus movimentos, tocar-te e os meus dedos tocam-te agora, sentes, e os meus olhos tocam-te, e a minha boca toca-te e os meus dedos tocam a tua boca e só nasceram para isso, sentes?

 e quando leres isto não vais ter a certeza de que foi escrito para ti e vais ter medo que tenha sido escrito para ti e vais perceber que só poderia ter sido escrito para ti apesar do medo, que não preciso que poses para mim para te escrever porque caminhas nos meus olhos e eu gravo os passos do teu olhar 

Comentários

  1. * E nunca poderás saber, sem que te diga...sem que a memória do teu andar se esfumasse dos meus olhos..!!E quiça aprenderás a decifrar o meu alfabeto sem que te diga...* e eu concluia mais ou menos assim =) beijo

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  2. Olá MIMLima,isso seria o início de uma bela carta,sim?

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