quando eu beijo o beijo que é meu e que tu guardas


perguntaste-me muitas vezes quando falámos ontem: mas o que é que mudou?

se calhar não mudou muita coisa: aconteceram-me os teus lábios e em mim a consciência dos teus lábios, acho que não posso explicar isto de forma mais simples e acertada, aconteceram-me os teus lábios e isto é dizer muito

aconteceram-me os teus lábios. acordei. não estavas aqui. era Outubro e Outubro não era só Outubro, era também Novembro e era Dezembro e Janeiro e eu não quero que Outubro se estenda por todas as horas que estão para nascer e morrer, ou quero mas não se não estiveres aqui e aqui é uma eternidade sem lugar
aconteceram-me os teus lábios e eu apercebi-me que tu me apeteces sempre e deixei de lutar contra o facto de tu me apeteceres sempre e por muito que morra vão apetecer-me sempre os teus braços e não me apetece lutar mais contra isso e não só os teus braços a tua pele suada  as pequenas sardas do teu pescoço nos meus dentes a tua carne a moldar-se nos meus dedos que tu és o sol que se esconde por trás do sol, um sol mais magnífico e mais radiante e mais quente, e a lua e o brilho do sol e da lua

e se te digo coisas que mais nenhum homem te diz é apenas porque tu és um  milagre criado para mim, e eu sei agora reconhecer  isso e sei também que não temos música não temos datas marcadas no calendário e provavelmente não me lembro do nome do dia em que se deu o segundo eterno em que os teus lábios tocaram os meus pela primeira vez embora lembre exactamente o que trazias vestido e se não lembro o resto é porque o resto não existiu porque quando eu beijo o beijo que é meu e que tu guardas tudo desaparece o mundo não existe os dias não existem a morte não existe, somos só nós e juro que neste momento te ouço dizer-me ao ouvido somos um só, somos um, e somos mesmo e que se lixe a música que não temos e que não existe porque quando estou contigo toda a música de que preciso vem de dentro do teu corpo toda a música e poesia vêm de dentro do teu corpo onde constelações de música e poesia me dizem somos um só me cantam somos um só me gritam somos um só

e sinceramente não acho que fomos feitos um para o outro na cama que é claro que fomos feitos um para o outro na cama, mas não só, na cama é onde já percebemos que encaixamos perfeitamente e se dá a magia mas esta magia é só um espelho da magia que podemos ter e ser e nem precisamos que tudo seja perfeito

e agora bateram-me à porta e juro que só tu na minha cabeça

 e não precisamos que seja tudo perfeito porque mesmo nos dias tristes, e não te engano, haverá dias tristes e dúvidas e já não te aturo mais, mas não precisamos que seja tudo perfeito porque mesmo nos dias tristes um fio dos teus cabelos o teu cheiro os meus braços, porque mesmo nos dias tristes e de dúvidas e de já não te aturo mais serás a única, porque tu és única porque quem te tem tem todas as mulheres que existiram e que existirão

e ainda que isto não corra como eu espero que corra ainda que tu digas não: ainda que tu suspendas o tempo: ainda que obrigues os pássaros a inventar a respiração: ainda que cales as bibliotecas,
põe-me em modo de espera , e sabe que eu saberei esperar-te
e não temas e não duvides e afasta o medo porque tu serás sempre quem os meus olhos vêem, mesmo quando já não possam ver

e ainda que não me queiras, mesmo querendo como me queres porque quando me vês só existo eu, tu cega para tudo o resto, mesmo perante a sombra desse sofrimento descansa, nunca me magoarás, nunca me farás sofrer, porque eu  saberei sempre que tu vales todos os riscos por isso saberei sempre que desta vida já recebi muito mais do que ela valia

e só um beijo teu

e sei que isto que escrevo agora não vale 19 rosas (não havia 20 na loja?), talvez não valha sequer aquela que nunca te dei, mas só as histórias verdadeiramente tristes têm rosas e rosas qualquer um pode dar e as histórias tristes têm rosas mas não têm poemas, esta história tem poemas mas não tem rosas, só pétalas deitadas numa cama, só pétalas nascidas para te esperar, para sentir o teu corpo, para marcar o teu corpo como meu, para te mostrar o caminho para casa enquanto eu te levo ao céu e ao inferno e aperto o teu corpo contra todas as paredes nascidas para o nosso calor para o teu fogo para tu morderes o lábio não só quando estás a pensar para eu em ti e tu em mim para nós um só para um cigarro que isto merece um cigarro enquanto a lua insiste em dourar o teu flanco e é tudo tão natural, tudo tão forte e natural,

e nenhum medo apenas um verso que escrevi sem saber que era para ti que o escrevia: morreria para poder seguir os teus passos molhados a caminho do quarto

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