Prelúdio para um beijo
Vem nas
enciclopédias que no princípio era o sonho.
Daqui donde te
escrevo já não se ouve a luz com que me acordavam os teus olhos.
Daqui donde te
escrevo, não se ouve a luz, nem o entardecer onde esqueci em que degrau parei
quando te soube outro. Só sei que o teu amor foi sempre esse sol inclemente e a
tua mão a estrada.
E se te dizia querer
o amor inteiro, o que guardei nas palavras, e há palavras que envelhecem dentro
de nós sem nunca conhecerem o início dos lábios. Ainda o quero. Dos teus
lábios. Envelhecem tarde. Dos teus lábios. E os lábios envelhecem.
E as manhãs de Junho
azul quando as manhãs acordavam com copos sujos, de que se encarregou a noite.
Sempre que chegavas
era o amor que eu queria que batesse à porta. E tu não nasceste. E é difícil
ter linhas invisíveis para caminhar se sabias que eu sempre caminhava.
Hoje sei que não é
bom expormo-nos à crueldade do sol que aquece devagar. Fahrenheit a noite
estala: tu foste chuva eu era lava, agora, sem brisa, a boca é cinza, as ruas
são cinzas. E verde, coruscante, verde, Sintra, no inverno e no verão.
Por vezes o destino
não é pior do que o imaginámos e o teu beijo ainda é o nada que é tudo, mapa
duma alegria onde me guiavas por instinto. Que a tristeza nota-se sempre mais
de lado quando te vejo. Mas já não te vejo e,
Ainda guardo búzios
donde bebemos, ainda guardo oceanos, ainda guardo forças para te dizer o que
calei: ainda te aguardo. Não há viagem que me possa fazer feliz se a minha alma
só era feliz porque era a tua, porque foi ali e ainda te guardo. E já não
viajo…
Ouves? Daqui donde
te escrevo já não se vê a luz! Já não te ouço. No escuro as minhas mãos só te
vêem assim. E as mãos sabem! O tempo cumpre as promessas que faz e já não se
espera que os dias possam ser corrigidos pela música. E as mãos sabem!
Vejo que unindo
todos os tremores os pontos fariam algum sentido, mas depois fugia.
Quero que vás,
agora. Só não vás tão longe que te surja a noite sobre o nome que te beijou.
Perdoa as noites em
que ainda és sol mas o coração já arrefece, dormente.
Dos lábios, houve um
beijo que só conheceu princípio, e no princípio era o sonho.
Vem nas
enciclopédias que no fim já não há sonho, sabes?
Adeus saudade.
Aqui me despeço de
ti.
Já só te escrevo com
as palavras dos livros que eram e que li contigo. Já não és mais dos teus
lábios. Dos teus lábios!
Adeus palavra. Dos
lábios, perdoa o beijo.
E se hoje começam as
coisas que me estavam destinadas para sempre, não posso prometer mais nada.
Maria Supertramp
Ao ler este texto confirmou-se o que eu já desconfiava: o dom da palavra esta onde mora o sentimento.. Um texto verdadeiramente belo :)
ResponderExcluiré verdade...mais do que o escrever...sentir tudo com a pele toda.
ResponderExcluirNão está nenhuma super trampa nem nada parecido este texto! Bô! Sentir tudo de todas as maneiras! ;)
ResponderExcluirsentir tudo de todas as maneiras...
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